África, 1973
Os tempos eram outros. A terra Moçambique. A vida diferente. Os anos passaram como passam para todos. Hoje continua uma mulher lindíssima. Outra idade, mas lindíssima. Outra experiência, mas finíssima. Quando a viam na rua chamavam-lhe Amália. Ria-se sempre que lhe pediam para cantar um fado. Outros tempos também os de Amália.
- Nāo canto. Nāo canto. Nāo sou eu.
Nāo, nāo era. Chama-se Maria. Alexandrina. Mas Maria.
Ao colo, neste dia, o meu irmāo. Tempos que eu nāo partilhei. Faltavam uns anos ainda. Mais tarde, cresci a ouvir em família sobre o seu bom gosto, as casas em África, a sua força, a sua história, a sua teimosia.
Ontem ao ver fotografias relembrei essa beleza única de outros tempos. Nas fotografias uma diva do cinema. Mas na vida nunca quis, na realidade, nunca lhe passou pela cabeça. Tantas vezes me perguntou como eu conseguia subir a um palco sem medo.
- Nāo avó, nāo se sobe a um palco sem medo.
E logo me respondia: - Entāo como consegues?
Falou-me da única vez que pisou um palco. Da vez em que petrificou em frente a um batalhāo de gente. Foi obrigada. Nāo queria. Sempre disse que nunca quis.
Na vida é a força. Sempre que perdeu levantou-se e andou. Seguiu. E perdeu, levantou-se e andou. E perdeu outra vez recentemente numa idade em que já nāo devia ser permitido. Mas perdeu, perdeu quando o meu tio se despediu sem aviso. Depois desse dia, só depois desse dia envelheceu. De pé, mas envelheceu. Envelhecemos todos. Mas a minha Maria Alexandrina nāo mais foi a mesma.
Levaram-lhe a força, a vontade. Mantém a postura, a classe, a beleza, mas levaram-lhe a força.
Só tu, meu amor, trouxeste de volta parte dessa força.
Quando chegares saberás do que estou a falar. É a bisavó.
A vovó Xandrina.
Na vida o que conta é mesmo a família.
Contas muito bem a história de uma mulher que parece ser fantástica. Fiquei emocionada quando li.
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