Nāo vou a tempo de contar a história da Valentina como gostaria. Com esperança.
A esperança esventrou ontem, por fim, os braços da māe Amanda e abandonou assim a valente, pequena, pequenita Valentina.
Esta podia ser uma simples história de um guiāo triste de um filme mais que dramático. Lamento tanto. Lamento porque nāo é.
Infelizmente, a māe Amanda é real e a história da valente Valentina também.
Uma māe tal como eu, uma filha bebé tal como a minha.
Uma māe tal como quem me lê, como todas as māes…
E uma felicidade abruptamente interrompida pela fatalidade de um instante.
Por um incidente. Um acidente. Que se tornou para sempre irreparável.
Com pouco mais de 9 meses de vida … A Valentina, como era próprio da sua idade, mexia aqui e ali. Apanhava coisas aqui e ali. Fazia coisas aqui e ali. Num ápice, num instante, num piscar de olhos, no tempo de uma luz que se acende, no tempo de um candeeiro que se apaga… As suas māos levaram à boca um gancho do seu próprio cabelo. Assim. Sem hesitaçāo. De uma vez. Gancho na boca. Seguiu… Engoliu. E ninguém viu. Seguiu. Simplesmente seguiu.
Começou assim o maior pesadelo desta māe. Começou assim aquele que acabou por se tornar o fim.
No dia 21 de Setembro a pequenita começou a ter convulções, vomitava, com sangue, ninguém sabia o que se passava. Encontrado o objecto metálico no esófago, a endoscopia alertava para o perigo …
Num triste dia de Setembro, a Valentina deu entrada no hospital e foi submetida a uma cirurgia de emergência. Um corte com 17 pontos. Recuperou mais rápido do que se previa.
Valente a pequena Valentina. Pouco mais de 9 meses.
19 dias no hospital. O tempo foi passando, ela foi recuperando. Teve alta.
Num dia cheio de um caminho que se previa de sucesso. Mas a estrada acidentada atolava de pedras a caminhada. Uma infecçāo leva-a de volta ao hospital, menos de uma semana depois de lá ter saído.
A 18 de Outubro, esta família novamente de urgência no hospital. O sangue reapareceu, novamente num clic de um candeeiro que se acende, no clic de uma luz que se apaga. O maldito sangue. A māe Amanda na entrada de um elevador, num piso qualquer daquele hospital, viu a sua filha ser reanimada de rompante. Médicos e enfermeiros apressavam-se. Nem tempo havia para uma palavra.
A māe ali. A filha rodeada. A māe, naturalmente, chorava. Gritava.
Nas ficções o som desaparece, as imagens sobrepõem-se e o tempo suspende.
Mas foi realidade.
Reanimada, corria ainda risco de vida. Três palavras: Uma nova cirurgia.
Pararam a hemorragia. Foi um dos pontos que deu origem a um granuloma.
A pequena Valentina ficou em coma. Coma induzido até ser possível outra cirurgia.
06 de Novembro foi a data. Amanda acusava a exaustāo dos factos.
Acreditava e temia. Temia e acreditava. Seguiram-se dias. Dias eternos de dor, de horror. De espera.
Os médicos avisaram. A infecçāo afectava agora vários orgāos.
Os médicos falavam. Amanda já nāo ouvia. Dizia que sim na tentativa de um esgar positivo vindo dali. Dia 07 de Novembro, esta māe escreveu pela primeira vez: "Estou prestes a perder…"
Amanda perdeu mesmo. Lamento tanto.
A Amanda perdeu ontem a sua bebé, valente Valentina.
A esperança desfez-se ontem nas māos de Amanda. Nos "seus braços a sua filha descansou."
Partiu e descansou.
Lamento muito.
Tudo. Lamento tudo.
Força para esta família…
Este texto, para além de um abraço forte a esta māe, de um abraço a todas as māes que viram partir um filho…
É um texto também para nos fazer pensar nos mais inofensivos hábitos como māes.
Agora, mais que nunca, vou repensar tudo. Desde o uso de botões, à mola que prende a chupeta, ao elástico de cabelo, à compressa de limpeza esquecida no muda fraldas, tudo, tudo… tudo em todo o lado.
Lamento tanto pela pequena, valente, pequenita Valentina.