Fotografia de: Mohammed Abed
Lisboa: Este é um lugar de paz. De tranquilidade. Pode até ser uma pacata inquietude. Um tranquilo lugar de ansiedade. "Uma estranha forma de vida". Uma impaciente crise de presente e de futuro.
No entanto... De paz.
Falta a de espírito mas fica a paz. A paz das nossas ruas. Das nossas copas das árvores. Das nuvens brancas em céus intactos. Das ecolas de férias à espera do regresso dos seus alunos. Das maternidades e hospitais onde entramos e nos entregamos à confiança de quem nos recebe.
É assim Lisboa. Somos assim Portugal.
O pior que temos nāo chega sequer a ser o bom ou o melhor de outros.
Aqui somos também um lugar inquieto e triste. De nota contada e tostāo furado. De māo atada e queixo baixo.
Mas somos também um lugar encantado. De māos dadas ao mundo, o lugar para sol, sorrisos e abraços. Amizade espalhada. Espelho de mar. Luz encantada. Paz relaxada.
Longe da guerra. E de alguma forma longe de alguma paz. No entanto, por mais que nos falte, nāo sabemos o que é temer ataques dos céus. Armas por terra. Corpos desmembrados. Lutos em massa. Ódios eternos.
Nāo sei de guerra. Nāo consigo saber de guerra. Perco o norte só nas imagens. Hospitais? Maternidades? Civis? Homens, mulheres, crianças? Bebés...
Mantas de sangue que cobrem corpos acabados de nascer... Acabados de morrer.
Famílias inteiras. Do céu caem panfletos e nāo... Nāo é mais um festival de verāo. Nesta guerra ninguém se lembrará o que é música. Os sons distantes de tambores, de instrumentos. Os instrumentos sāo mísseis. Sāo armas. Armamento. As notas, pedaços de corpos. Que estoiram. Que morrem.
Ouço, leio e releio
"Israel defende o seu povo com mísseis. Hamas defende os seus mísseis com o seu povo" "Ambos os lados têm culpa" "A culpa da guerra nāo se mede por quem faz mais mortos ou feridos" "A diferença é que Israel podendo matar mais, mata o mínimo que lhes é possível. Hamas podendo matar mais, aniquilava todos." "Israel quer paz. Hamas quer guerra." "Pobre Palestina que nāo sabe escolher os seus líderes"
Tudo imperceptível ao meu mundo.
Ao que conheço. Ao que sei que desconheço.
Imperceptível.
Maternidades? Hospitais? Vidas atrás de vidas. Mortes atrás de mortes.
Crianças sem paz. Crianças sem infância. Pais, māes que correm, que gritam, que sofrem... Filhos feridos nos braços, sem braços.
Mantas de sangue sobre corpos acabados de nascer... Sobre corpos acabados de morrer.
Conhecemos muito pouco, quase nada, disto. Aqui, longe, mesmo com imagens, textos, informaçāo... Nāo conhecemos nem uma pequena parte disto.
Todas as manhās agradeço aqui este lugar onde somos, este lugar onde estamos. Lisboa.
Ainda que um dia nos falte muito, esperemos continuar a ter a tranquilidade do nosso céu, o brilho do nosso mar e o sorriso dos nossos filhos.
Deveria ser assim em cada lugar. Quem dera fosse como aqui em todos os lugares.